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Professor, Músico, Audiófilo, Cientista Político, Jornalista, Escritor de 1968.

segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

Os Beatles e Um Walkman

Ai, nostalgia. Esse texto tem uns 10 anos, but what the fuck...
As primeiras coisas relacionadas à música que me lembro são, invariavelmente ligadas aos Beatles. Foi uma pena eu ter vendido aquele exemplar do Revolver, brasileiro, estéreo, com o selo Odeon amarelo, que estava em bom estado de conservação. Que lástima não poder contar com ele em minha coleção de vinis atual, pois aquele com a assinatura de Flávio David na capa é meu primeiro contato com a arte.
Doutra feita, sem estar acreditando que teria o disco, em um passeio pelo Centro com minha mãe, a atormentei para que “me desse um disco”. Ela foi comigo ao escritório de meu pai, no Banco Iochpe, e, sem que eu esperasse, pediu-lhe “que me desse um disco”. Eu escolhi o Help, porque em uma brincadeira de um dia quente à tarde, na casa do Alexandre Farina, nós pegamos vassouras e acompanhamos toda a reprodução na vitrola da irmã do Ale. Foi a primeira vez que fiz mímica de tocar guitarra, e isso me levou a, entre tantas (e tão altas) pilhas de discos da Renner escolher aquele que tem The Night Before, que o Ale, pequeno, imitava como “Olaipifô”, podes crer.
Ouvimos também o Rock ‘n Roll da K-Tel. Depois, eu acho que em relação a esses meus amigos primeiros, eu evolui muito, sempre ouvi mais música que todos. Tinha fases, é claro, mas transformava, invariavelmente, a música na primeira das artes, desde logo superando o desenho – que foi a primeira. Me metia a ouvir coisa de velhos, Paul Mauriat, Ray Coniff e Frank Pourcel, e o fazia com paixão. Ficava tão treinado o ouvido, o ritmo, a sensação de profundidade, o peso dos graves e a fugacidade elétrica dos agudos. Ouvia os amigos violeiros de meu pai em churrascos de fim de noite tocando de tudo, principalmente sambas clássicos de até os anos setenta, passando por tangos e boleros em Espanhol.
Houve um veraneio em uma casa de madeira na praia de Cidreira em que me aprofundei numa fita do Álbum Branco ouvida à exaustão em um dos primeiros Walkman que se teve notícia, trazido por meu pai de uma viagem a São Paulo. Coitado, o motor dele era fraquinho, era azul a tal máquina e de uma firma desconhecida, Sony. Achei que era uma falsificação barata daquela marca que todos conheciam muito bem, Sanyo. Foi lá por 79, talvez 1980.
Retrocedendo um pouco, quando eu era bem pequenininho, gostava de tocar uma tal de clarineta cuja marca não me recordo. Era vermelha e tinha botões de metal, feita especialmente para crianças com vocação musical como eu exercitar as primeiras noções de escala maior e, ao mesmo tempo, a continuidade de permanecer soprando um instrumento. Tive várias que sempre estragavam suas palhetas porque sou muito babão em instrumentos de sopro. Talvez, por isso tenha escolhido aprender piano, depois violão, depois contrabaixo elétrico, e viva o Paul McCartney.
Quando morei em Curitiba, 1977, comecei a gravar programas de rádio em um daqueles gravadores mono, caixote, com teclado horizontal, lembram? Aqueles que serviam de unidade de transferência de dados para computadores brasileiros na década de oitenta. Pois bem, nos programas eu e meu amigo Claudinei imitávamos, de uma maneira infantilmente empostada, a voz dos locutores da Rádio Guaíba Am de Porto Alegre, que pegava muito bem em nosso rádio Transglobe. Eu adorava um disco de valsa de Billy Vaugham, mas peço aos amigos que não riam de minha excentricidade de criança-em-cadeira-de-rodas-com-nove-anos-e-longe-da-terra-natal.
Que eu me lembre, já inventava cantando esquisitos e incompreensíveis epopéias musicais que só uma criança hiperativa como eu poderia fazer, de fato, penso que não era nada realmente significante, exceto que muitas delas posso ter conservado na cabeça sob forma de neblina que esquenta os pensamentos em certas horas do dia e produz arte, coisas novas. Hoje em dia bem já posso registrar isso tudo qualquer hora, se me lembrar. Cantava com os pés para cima na parede, me imaginava o Frank Sinatra, ou então estava em um programa de entrevistas e era famoso falando sobre minha vida de adulto e poder. Como as crianças são capazes de abstrair realidade que, em primeira hora, não lhes pertence.
Foi um sucesso, em 1980, o filme Saturday Night Fever, com John Travolta e todos queríamos dançar como ele. E, por tabelinha vem o Xanadu com a Olívia Newton John e, em seguida, o Grease. Na casa de minha prima Janine, os adultos iam para o pátio ou para a enorme cozinha tomar café, e tínhamos a sala com aquele som poderoso que ele tinha para podermos dançar à vontade. Fazíamos, mais à noite, exibições de dança para os adultos sentados em filinhas de cadeiras, no escuro, com uma lanterna introduzindo o mise en scene, e éramos da nossa época, pré-adolescentes. Nos anos seguintes foi o tempo das Discotecas, da novela Dancin’ Days (e sua trilha sonora internacional) e da coleção dos discos da New York City Discotheque, tinha Isn´t She Lovely do Stevie Wonder. Papagaio Disco Club, Hippopotamus Disco Club, Patrick Hernandez, Santa Esmeralda, Banana Power, Roberta Kelly, Glória Gaynor, Donna Summer, Village People, Barry White, Earth Wind and Fire, tanta coisa que nos fez requebrar pra caramba. Era a continuidade da androginização dos comportamentos. Agora todos dançavam iguais e separados.
É importante não esquecer que a partir de 1979 comecei a participar de uma Banda Marcial e a ter aulas de Piano, que foram fatos relevantes, mas ficam para uma crônica própria sobre o assunto. O que importa aqui é o desfecho de minha paixão por Beatles fase um, que culmina no dia de meu aniversário, em 1981. Eu já tinha comprado outros discos dos Fab Four, me lembro, principalmente a coletânea azul 1967-1970 que me introduziu à fase psicodélica, I Am The Walrus ... E o véio Flávio me enrolou um mês dizendo que não tinha dinheiro para me dar todos os que faltavam, a maioria, de uma só vez. Me pediu listas de outras bandas cujos discos eram mais baratos, ai, que embromação. Boa tática, pois aprendi com aquela lição o valor inestimável e insubstituível que tem uma surpresa. Puxou, à noite, depois de chegar em casa, de cima do roupeiro que hoje está em meu quarto de casado, duas sacolas da Pop Som contendo uns 15 discos cada uma. Também descobri o poder da catarse, do amor do pai, do que significaram os Beatles, da magia da música naquela noite. Eu que já lera a edição especial sobre o conjunto editada pala Somtrês escrita por Marco Antônio Malagoli, entrei em êxtase ao ver o Sargeant Pepper’s se materializar em minha frente, ele e todos os seus colegas que eu tanto imaginara de olhar para o anúncio da coleção que vinha em capas de papelão que protegiam os discos. Todas aquelas maravilhas, novinhas, cheirando a novas, que momento inesquecível presenciou aquele meu velho Três em Um – que ainda funciona, e bem, hoje em dia.

2 comentários:

Fred Benning disse...

David, que legal kra, todas essas recordações de criança, tambem tento preservar as minhas.

Abração

Anônimo disse...

Beleza Fred Wood. obrigado. Quem sabe tu escreves algo Também. Abraços!